Vamos falar hoje sobre os ricos. Mas quero esclarecer primeiro a que tipo de riqueza me refiro. Falo da riqueza material. Daqueles que têm dinheiro!

Nesta encarnação não sou rico. Já tive momentos de em que desfrutei de muito conforto e posição social, mas rico mesmo, de ter dinheiro sobrando, guardado para fazer tudo que quisesse, não. Isso nunca tive!

Mas convivi socialmente com pessoas de grande poder aquisitivo e poder político. Creio que em outras vidas já devo ter possuído muito dinheiro, pois sempre fui bem aceito na “alta roda” e tive facilidades por conta disso.

Desta convivência guardei a experiência da dificuldade que um rico tem para poder obter a caridade espiritual, para obter a orientação nos momentos em que passa situações que fogem ao controle, independente da quantidade de dinheiro que possam ter.

Recordo da dificuldade inicial do Trino Tumuchy em aceitar que os “ricos” passassem na frente nas filas de atendimento, relatada no livro “Sob os Olhos da Clarividente”. Porém Tia Neiva, e mais precisamente, Pai Seta Branca nos deixou uma lição que por vezes esquecemos ao levantar a bandeira da “justiça”:

Meus filhos!

É preciso ter caridade para com os ricos, pois suas vidas são mais difíceis que as dos pobres. Estes já têm tudo de que precisam para sua evolução, pois a própria condição de pobre lhes dá isso. A rudeza da sua vida não os deixa sentir os problemas com maior intensidade.

Mas, o Homem que recebeu uma educação, tem uma certa finura e sensibilidade, esse sofre muito mais. Não quero que vocês o submetam a humilhações.

Vocês sabem o quê significa, para uma pessoa educada, disputar um lugar para ser atendido por vocês? É preciso, portanto, dar mais atenção a eles. Por que submeter uma pessoa fina, educada, limpa, à humilhação de sentar-se no mesmo banco com uma pessoa grosseira e cheirando mal? O pobre não se sente muito mal ao sentar-se nesse banco, mas o rico sente.

Vocês já repararam como o homem rico de Brasília tem dificuldades em encontrar um lugar para se tratar? Os hospitais de Brasília nivelam todos quase no mesmo plano. Por isso, quero que vocês, no futuro, construam um hospital onde o rico possa ser tratado com o conforto que merece.

E há, ainda, as tradições humanas. Convencionou-se que a caridade é para os pobres, os miseráveis, e se faz disso uma indústria. Essa é uma idéia muito material da caridade! Até essa palavra está tão desvirtuada que prefiro que a usem o menos possível. Todos merecem ser bem tratados, e não quero que se demonstre ressentimento a uma pessoa, só porque ela tem um carro e um padrão de vida melhor.

Lembrem-se de que vocês conhecem a precariedade da existência na Terra. O homem que hoje é rico e poderoso, ontem foi, talvez, um pobre miserável. E o pobre de hoje foi, talvez, o rico que ontem desperdiçou sua fortuna e oprimiu outros.

Todos devem ser bem tratados, mas cada um merece atenção de acordo com seu padrão!... (Pai Seta Branca)

Nestas palavras encontramos a necessidade de tolerância.

Quantos de nós já ficamos irritados por ver uma pessoa de melhor condição social ser atendida antes?

Quantos de nós,quando os encarregados em acomodar os pacientes, fizemos os mais afortunados materialmente passar por humilhações, ou mesmo desistirem do atendimento?

Não podemos imaginar o quanto é difícil para uma pessoa de padrão material elevado vir buscar o auxílio no humilde trono do Preto Velho... Normalmente só chegam neste ponto em desespero total! Já passaram por todos os lugares possíveis em busca de ajuda, antes de se submeter as nossas humildes condições. Afinal, na maioria, nossos Templos ainda são pequenos e seus médiuns desprovidos de grandes posses.

Zelar pela limpeza do Templo, por acomodar da melhor maneira possível os pacientes, ter um sorriso fraterno de recepção, sentindo a intuição necessária na hora de acompanhar até o atendimento, por vezes é mais que uma simples caridade. Você hoje, em condição material desfavorecida, com certeza aguarda o reencontro com aqueles aos quais prejudicou com sua fortuna em outras vidas...

Kazagrande

Abaixo o texto completo supracitado.

MORTE COM HORA MARCADA

Mais um dia de consultas de Neiva. Desde as dez horas da manhã, o povo se comprimia no recinto do Templo reservado ao público, e a impaciência era sensível no ambiente. Em sua maior parte, os consulentes eram gente simples. Às seis horas da manhã já haviam formado fila diante da porta do Templo, em busca de uma ficha, e o número de pessoas a serem atendidas já se havia esgotado.

Um carro parou bem junto ao Templo, e dele desceram algumas pessoas bem vestidas. Uma senhora de certa idade, duas moças e um rapaz. A senhora demonstrava ser pessoa de bom trato, enquanto as moças e o rapaz usavam calças coloridas e cabelos longos. Tão pronto se aproximaram da porta do Templo, formou-se um clima de hostilidade. A senhora, demonstrando certa familiaridade com o ambiente, abriu caminho por entre o povo e se aproximou da moça que atendia os candidatos à consulta. Falou com voz baixa e a moça foi até à Clarividente, voltando daí a poucos instantes. Pediu licença aos que obstruíam a entrada interna, e conduziu os quatro para um banco próximo ao local onde Tia Neiva consultava. Um murmúrio se levantou no meio do povo. Uma pessoa menos paciente fez um comentário áspero. No meio do vozerio que se formou, distinguiam-se as palavras grã-finos, ricos e termos semelhantes. Neiva levantou-se, e se voltou para o povo, que se calou de pronto. De pé, sem nada dizer, ela ficou olhando para aquele povo simples, todos de olhos baixos, e por fim falou, pedindo que tivessem paciência. Disse que todos seriam atendidos e que a família que acabava de ser admitida tinha um problema muito mais sério do que os deles. O povo se acalmou, e o dia de consultas prosseguiu normalmente.

Eu me havia perturbado com a cena, e sentia certa irritação. Todo dia de atendimento surgia esse problema. As pessoas mais simples, geralmente moradores das proximidades, chegavam de madrugada, e absorviam todas as vagas. O pessoal de Brasília, quando chegava, já não conseguia lugar. Eu já havia estudado várias maneiras, mas nenhuma dava resultado, sempre surgia alguma perturbação.

As consultas terminaram cerca de oito horas da noite. Meus nervos estavam à flor da pele, e Neiva sentiu meu estado. Após a refeição frugal, ela me perguntou o que eu estava sentindo. Aí, explodi, e fui dizendo:

- É esse seu atendimento, Neiva. Precisamos dar um jeito nisso. Toda hora tem enguiço com esse pessoal de Brasília. Por que eles não vêm cedo, como os outros?

- Calma, Mário, não se preocupe muito com isso. Deixe estar que dou um jeito com minhas meninas. Isso é assim mesmo. Aos poucos, o povo vai aprendendo. Você parece que também está irritado com os grã-finos! Já se esqueceu da lição de Seta Branca?

- Que lição? – retruquei, ainda irritado.

E ela, remexendo com o garfo a comida esquecida no prato, foi-me lembrando as palavras do Mentor. Aos poucos, fui-me acalmando, e meu espírito se encheu de admiração pela sabedoria daquele excelso espírito. A lição de Seta Branca foi muito simples. Ele disse:

- Meus filhos, é preciso ter caridade para com os ricos, pois suas vidas são mais difíceis que as dos pobres. Estes já têm tudo de que precisam para sua evolução, pois a própria condição de pobre lhes dá isso. A rudeza da sua vida não os deixa sentir os problemas com maior intensidade. Mas, o Homem que recebeu uma educação, tem uma certa finura e sensibilidade, esse sofre muito mais. Não quero que vocês o submetam a humilhações. Você sabem o que significa, para uma pessoa educada, disputar um lugar para ser atendido por vocês? É preciso, portanto, dar mais atenção a eles. Por que submeter uma pessoa fina, educada, limpa, à humilhação de sentar-se no mesmo banco com uma pessoa grosseira e cheirando mal? O pobre não se sente muito mal ao sentar-se nesse banco, mas o rico sente. Vocês já repararam como o homem rico de Brasília tem dificuldades em encontrar um lugar para se tratar? Os hospitais de Brasília nivelam todos quase no mesmo plano. Por isso, quero que vocês, no futuro, construam um hospital onde o rico possa ser tratado com o conforto que merece. E há, ainda, as tradições humanas. Convencionou-se que a caridade é para os pobres, os miseráveis, e se faz disso uma indústria. Essa é uma idéia muito material da caridade! Até essa palavra está tão desvirtuada que prefiro que a usem o menos possível. Todos merecem ser bem tratados, e não quero que se demonstre ressentimento a uma pessoa, só porque ela tem um carro e um padrão de vida melhor. Lembrem-se de que vocês conhecem a precariedade da existência na Terra. O homem que hoje é rico e poderoso, ontem foi, talvez, um pobre miserável. E o pobre de hoje foi, talvez, o rico que ontem desperdiçou sua fortuna e oprimiu outros. Todos devem ser bem tratados, mas cada um merece atenção de acordo com seu padrão!...

Quando ela terminou, meus pensamentos estavam muito modificados a respeito desse assunto. Neiva, então, contou um caso que se passara há alguns anos, na antiga UESB, que bem demonstra o que Seta Branca queria dizer:

- Mário, você não conheceu a UESB. Lá é que a pobreza se concentrava, nos seus aspectos mais tristes. Meio alqueire de terra de cerrado e água escassa. Beira de estrada, a meio caminho de Anápolis, próximo a Alexânia. Quando começamos, Brasília ainda estava em obras e quase não havia assistência hospitalar. Os pobres e desajustados, que em grande quantidade vinham para cá, atraídos pela miragem de um futuro melhor, acabavam por procurar socorro na UESB. Nossas construções eram todas de barro e cobertas com palha. Todos os dias, uma verdadeira multidão se concentrava lá. Vinham a pé, de carroça, a cavalo, ou desciam dos ônibus que faziam a linha de Brasília. Portavam as moléstias mais terríveis e muitos pediam para ficar, pois não tinham para onde ir. Improvisamos um hospital, à nossa maneira, e tratávamos todos os tipos de doenças. Predominavam os problemas mentais. Trabalhávamos dia e noite, sem parar. Eu atendia numa pequena palhoça, bem no centro da comunidade. Certa tarde, as coisas estavam particularmente difíceis. Como você sabe, Mário, aquela concentração de pessoas desajustadas formava tremendas cargas espirituais negativas. A par do simples atendimento, tínhamos que manter o ambiente psíquico em constante renovação. As cargas, às vezes, pesavam demais e, até darmos conta da limpeza, o ambiente permanecia pesado. Naquela tare, as coisas estavam dessa maneira. O povo esperando nos arredores de minha cabana, estava impaciente e, a toda hora, as meninas que me ajudavam tinham que acalmar pessoas. Nesse ambiente de tensão, chegou um vistoso carro Simca, e dele desceram duas senhoras em traje de viagem, demonstrando serem pessoas de posses. Tão logo localizaram Jesualda, minha pequena assistente, foram logo dizendo que queriam falar com dona Neiva, mas que dispunham de pouco tempo, e queriam ser atendidas logo! É fácil imaginar a impressão que isso causou entre os que esperavam, alguns já há muitas horas. Levantou-se um murmúrio de protesto. Jesualda pediu-lhes que aguardassem um instante, e correu até mim, pedindo instruções. Meu primeiro impulso foi o de mandar dizer àquelas senhoras que teriam de esperar, pois havia pessoas necessitadas a serem atendidas. Mas, nisso, Mãe Etelvina me mostrou, de relance, o quadro delas, e fiquei horrorizada! Mandei que entrassem de imediato.

- E o povo não protestou? – perguntei.

- Sim, a gritaria entre os que esperavam foi grande. Só nossa posição moral, que impunha muito respeito, evitou que acontecesse algo pior. Alguns se levantaram e saíram dizendo as piores coisas a meu respeito. Ouvi distintamente quando uma mulher disse ser eu uma bajuladora de grã-finos, e outras coisas desagradáveis. Um homem da roça, cujo apelido era Bodinho, que há muito vinha se tratando conosco, desandou a falar grosserias e só parou quando um de nossos médiuns lhe pediu. Apesar de tudo, fiz entrar as duas mulheres, que se sentaram diante da minha pequena mesa, e se apresentaram...

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